20060520

Ad Amicum ( a um amigo)

"Cigarro" - cortesia de um amigo

Então não digas nada… eu calo-me e fico aqui…
Gosto de ficar aqui sossegado a ver-te escrever… afinal foi só isso que fiz até hoje: observar-te… conheço todos os detalhes, ou apenas aqueles que deixavas transparecer na tua aparente serenidade… Não me lembro do primeiro dia em que te vi… mas… recordo-me do momento em que sem saberes alojaste-te nas bruma da minha memória: trazias umas calças rasgadas no joelho direito – não rasgadas abruptamente mas, com um corte perfeito na horizontal… Sem querermos ficaste a fazer parte das minhas manhãs, e de algumas tardes também… Dos últimos lugares, via-te entrar: de negros dos pés a cabeça salientado o teu rosto pálido, fino e sereno, de head fones nos ouvidos entravas, percorrias o corredor e por instantes via-te a entrar no teu mundo…

As vezes tentava compreende-lo… mas sempre que tentei lá entrar perdia-me… então criei-te um… e coloquei-te no meio dele…

Perguntava-me: que ouvirias tu nos teus head fones, que pensavas de todo aquele alarido… Será que sabias que existia? Uma vez imaginei-te meu amigo… ali no 32… sentados lado a lado ou frente a frente a conversar… banalidades, daquelas conversas que só os amigos têm: umas muito metafísica e intelectuais outros puramente jocosas… quer dizer sempre pensei que não gostasses muito de coisas jocosas… nunca te vi sorrir… sempre compenetrado no teu mundo… não te consigo ver rir…

Sempre ansiei pelo dia em que ias entrar imponente como sempre e me ias dizer alguma coisa, qualquer coisa, mas alguma… nunca chegou…. A tua voz é uma incógnita mas creio que é suave, calma e tranquila…

Como o fumo dos teus cigarros desapareces-te no ar, nem o teu cheiro ficou… Mas… vejam… é… pois é… há quanto tempo: com o mesmo charme inconfundível via-te novamente a entrar no autocarro… agora não vens com tanta frequência… o negro deu lugar a outras cores… o mundo que fiz para ti após algum esquecimento entrou agora em mudança… no entanto continua incompleto…

O fumo que te levou, trouxe-te de volta, com uma diferença agora vejo-te como tu queres que te veja… o mundo que fiz para ti desmoronou-se e no seu lugar um infinito caminho de agradáveis surpresas surgiu… Agora parto a descoberta de ti… ainda não sei se te encontrei…mas sinto-te por perto… as vezes tenho medo de te deixar escapar… mas logo em seguida ouço-te e tudo se apazigua… vagueio pelo desconhecido e por isso estou inseguro… gosto do que vejo e por isso não quero deixar de ver… sei que posso ser aborrecido (as vezes), por isso vou continuar á tua descoberta…

;)

4 comentários:

Nuntius disse...

Pessoalmente acho a foto mais interessante que o texto... mas que se pode fazer...

Mikael disse...

Encontros e desencontros...
Eu não sou dado a acreditar em coincidências, gosto de pensar que existe algo mais forte por de trás delas, talvez por isso ao ler este texto acredite que existe algo "maior" do que uma série de encontros e desencontros. Certamente a Amizade de que falas, prémio raro.
Os mundos interiores por vezes são tão intensos que se torna difícil sair deles, ou permitir que alguém os fique a conhecer. Mas quer para um, quer para o outro é preciso haver sempre uma iniciativa. A de arrancar o outro desse mundo ou a de bater à porta e pedir para entrar, daí não perceber o teu papel de mero espectador.
Antes que o fumo se desvanecesse deverias ter tomado alguma atitude que não a de mero espectador, mas isso também não interessa agora porque depreendo pelas tuas palavras que esse encontro já teve lugar.

Encontros e desencontros... perfeito!

Abraço apertado

post scriptum - se eu fosse esse teu amigo iria sentir-me imensamente lisonjeado :)

Anónimo disse...

texto muito bom...

As coisas e as loisas dos encontros...

Da observação dos pequenos detalhes, extrair dai ilações...

É a essência da pequena vida que levamos... os pequenos pormenores que nos enchem o horizonte...

Grande texto...

Anónimo disse...

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